quarta-feira, 7 de maio de 2014

                  O LINCHAMENTO INCENTIVADO







O linchamento de Fabiane Maria de Jesus, 33, ocorrido no Guarujá, litoral paulista, ocorrido no último sábado, dia 03 de maio, é chocante, brutal, cruel, principalmente por ser um uma prova da irracionalidade incentivada e provocada.

A vítima foi objeto de infamantes boatos em página do Facebook imputando-lhe a prática de magia negra e de ter usado crianças raptadas em rituais. Os assassinos e o indivíduo que fazia a página não procuraram saber a verdade, se a ocorrência imputada era um fato ou maledicência.

Apesar da brutalidade do desfecho não devemos olvidar as possíveis causas deste crime. É fácil manejar uma campanha de ódio, não é preciso dispor de uma rede de televisão ou de rádio, basta um ou alguns hábeis na arte de intrigar soprarem no ouvido certo, que pode ser um ou vários, que sempre deságua em atos desta natureza, agressão ou linchamento, execução sumária.

Resta óbvio que satanizar alguém usando uma rede de televisão no Brasil é uma barbada. Sem regulação de qualquer espécie vicejam os programas que atentam contra os Direitos Fundamentais do Cidadão, os chamados DIREITOS HUMANOS - não basta para gente como Rachel Sherezade, Luis Datena e Marcelo Rezende substituir o Judiciário em julgamento sumário, tem que haver a execração.

O ex-ministro Zé Dirceu antes de ser julgado pelo STF quase teve sua cabeça atingida por uma bengala de mais de um quilograma de ferro manejada por um escritor de estórias para crianças. Se a bengalada tivesse atingido o alvo poderia tê-lo matado. Ninguém duvida que foi resultado da intoxição emocional promovida contra si pelas grandes redes de televisão, Globo, Bandeirantes - que sabiam o que estavam fazendo e o que poderia ocorrer.

A compreensão da propaganda e da manipulação da opinião pública já foi estudada por dezenas de autores. Contudo, o filme “A ONDA” demonstra com uma estória a tese de como é possível manipular pessoas, bastando que se saiba operacionalizar técnicas que incidam sobre a fragilidade da subjetividade dos homens.


O filme demonstra que o lado frágil da subjetividade humana é a faceta que aflora quando o sujeito sacrifica a capacidade de raciocinar e passa a aceitar proposições sem exigir provas ou a mínima plausibilidade como os dogmas ou falsa informação.



Demonstra também a tese do filme que as organizações secretas místicas ou supostamente laicas são já em si instrumentos de manipulação para a veiculação de doutrinas autoritárias pois a natureza conspiratória obsta a análise e facilita a fixação dos dogmas e o sacrifício da racionalidade.


Evidencia A ONDA também que os ritos e os símbolos podem ser também instrumentos de veiculação dos dogmas autoritários verificada a facilidade com que por estes meios eles são impostos e como facilmente por eles manipula-se condutas e atitudes.

Patenteia a tese demonstrada no filme que explorar com os fins de manipular as condutas os sentimentos de ódio, de inferioridade, frustrações ou sentimentos de suposta superioridade é fundamental para se operar na fragilidade da subjetividade, que ocorre quando o indivíduo sacrifica a capacidade de pensar sobre bases racionais e demonstráveis e abdica de apoiar a convicção em provas.

É por esta lacuna da subjetividade, o lado irracional, que se pode contrabandear para a pauta de crenças e valores do indivíduo como se verdade fosse proposições que não se amparam sequer em evidências mínimas.

Apelar para os sentimentos de crueldade agitando preconceitos, dogmas, explorar a ignorância e os sentimentos atávicos como o instinto de sobrevivência, o medo e o sentimento de grupo ou rebanho é uma fórmula infalível para a manipulação da opinião pública e das multidões.

Da apelação para o sacrifício da racionalidade se valem todas as doutrinas autoritárias, inclusive doutrinas políticas como o fascismo, ou simplesmente místicas comerciais como a sopa de letras de Paulo Coelho ou Edir Macedo.


A manipulação da opinião pública e a manipulação da informação

Pensar é um trabalho pois há dispêndio de energia, mas raciocinar e não sacrificar a racionalidade é o passo inicial para sermos livres e não manipulados.

Porque pensar é um trabalho e cansa, milhões de pessoas são manipuladas por preguiça, por indolência cometem "pequenas" injustiças repetindo boatos e informações inexatas.

Desta maneira, toda ação com fins de manipulação precisa alcançar a  desestabilização da capacidade de raciocinar em bases racionais pois só assim o insumo da atividade pensante, a informação, poderá ser aceita mesmo não sendo informação mas produto estragado, engodo.      

Foi nestas circunstâncias que o linchamento de Fabiane ocorreu cometido por uma turba assassina. Contudo, as circunstâncias foram maturadas durante largo tempo e bastou a ocasião para acontecer – dadas as circunstâncias poderia ter ocorrido com qualquer outra pessoa.

As circunstâncias morais e psicológicas foram maturadas principalmente pela ação das grandes cadeias de televisão ao veicular  programas da qualidade dos programas de Luis Datena, Marcelo Resende, incitação à violência em “comentários’” como os de Rachel Sherezade e outros iguais existentes em redes locais pelo Brasil afora.

Existem assuntos que excitam a opinião pública mais que outros e conduzem-na à histeria quando repetidos de diversas maneiras, principalmente pelos grandes grupos que controlam os meios de comunicação, entre estes se destacam anticomunismo, corrupção, aborto, irreligiosidade de grandes líderes, práticas religiosas de grupos minoritários (magia negra, satanismo), sexualidade alheia.

Também o medo e a sensação de insegurança real ou hipostasiada de ameaça de guerra, perda do poder aquisitivo por corrosão inflacionária do valor da moeda, a ameaça de fome ou a simples hipótese tornada crível de vir a faltar gêneros básicos, índice crescente de crimes contra a pessoa, podem ser explorados por propagandistas hábeis em mexer os cordéis que tocam fundo o psiquismo coletivo.

Estes assuntos quando escolhidos como mote para serem exagerados, repetidos de diversas maneiras e adaptados a diversos públicos alvos provocam a excitação, impermeabilidade a argumentos, desestabilização emocional, hiperestesia e perda do autocontrole. Tal a desordem mental que provocam quando agitados que os cidadãos não se entendem, defendem coisas contraditórias, impossíveis ou praticam atos ilegais abertamente.

O remate deste tipo de manipulação da opinião pública se dá em marchas, comícios, manifestações e aglomerações organizadas ou espontâneas, quando as últimas barreiras refratárias à instigação são rompidas.

Aqui no Brasil a mais conhecida campanha de ódio e desestabilização da opinião pública movida contra um governo constitucional ocorreu entre os anos de 1962 e 1964, quando uma opinião pública galvanizada e histérica foi manipulada pelos golpistas.  

Como nunca foi responsabilizada por atentar contra a democracia e por ter servido aos golpistas na instalação de uma ditadura sanguinária a mídia golpista voltou e permaneceu no local do crime, continua tendo por objetivo o envenenamento emocional da opinião pública, nem que seja para vender audiência e arrancar algum dinheiro de anunciantes à custa da desgraça alheia.

Um comentário:

  1. Excelente artigo! Muito importante não considerar esses fatos como acontecimentos isolados e traçar a similaridade entre eles, aparentemente díspares mas que são, no fundo, fruto do mesmo veneno.

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