domingo, 1 de dezembro de 2013

                UM  INSTANTE  NA  HISTÓRIA 




Cid Benjamin ampara Vera Sílvia impossibilitada de se pôr em pé depois das torturas sofridas em um Quartel do Exército. Foto de 1970 guardada no Arquivo Nacional em Brasília.
                   

Ao ver esta fotografia hoje, 24/11/13, divulgada pela Folha de São Paulo fiquei comovido pela grandeza e coragem de alguns brasileiros. Na foto estão duas pessoas, Vera Sílvia Magalhães e Cid Benjamim, ainda jovens. 

Na data desta fotografia, 1970, Vera e Cid tinham 21 anos de idade e pertenciam ao MR-8 (Movimento Revolucionário 8 de outubro), uma dissidência do Partidão sediada no então Estado da Guanabara. 

Eles fizeram parte de uma imensa legião de cidadãos brasileiros pelos quais sempre tive incomensurável admiração, respeito e um profundo sentimento de fraternidade, os bravos camaradas que fizeram a resistência armada contra os criminosos que assaltaram o poder em 1964 rompendo a legalidade, principalmente tornando sem efeito a Constituição de 1946.
Vera Sílvia faleceu em 2007 vitimada por um câncer; Cid está em plena forma e atuante, recentemente publicou o livro de memórias e reflexão sobre sua militância na luta armada com um título que é um verso: "Gracias a la vida - memórias de um militante". 

Ao romperem com o Partidão, que tinha como modelo de socialismo a URSS, os jovens militantes daquela época deram o passo inicial para libertar a esquerda dos dogmas do marxismo-leninismo, abriram o caminho para a existência de um partido de esquerda como o PT, um partido organizado em bases teóricas completamente distintas da teoria leninista de partido.
0s dois participaram da captura do embaixador americano Charles Burke Elbrick em 5 de setembro de 1969 - que foi trocado pela liberdade de 15 presos políticos embarcados no conhecido Hercules-56 para o México[1];  entre eles estava José Dirceu. 

Foram presos e torturados pouco tempo depois da libertação do embaixador. Segundo Vera[2] Cid lutava karatê e enfrentou os celerados da repressão em luta corporal no ato de sua prisão, foi ferido na cabeça e levou 15 pontos no ferimento, a frio, sem anestesia, dados pelo médico e auxiliar de tortura Amilcar Lobo (recentemente o próprio Cid respondeu a uma pergunta feita por mim sobre seus conhecimentos de karatê e me afirmou pelo Facebook que tinha praticado judô quando criança). 


Os dois jovens guerrilheiros só ganharam a liberdade e o exílio quando foram trocados juntamente com mais 38 presos políticos pelo embaixador alemão Erenfried von Holleben[3] capturado e trocado em junho de 1970 em uma ação comandada por Eduardo Collen Leite, o intrépido Bacuri. 

Vera dizia que só os melhores de sua geração optaram pela luta armada. Não tenho dúvidas da verdade desta afirmação da bela e destemida ex-guerrilheira. A sociedade brasileira foi vergada pelo terror de Estado, instituições como o Judiciário e o Ministério Público foram reduzidas a nada pela violência ou ameaça, promotores e juízes que hoje se arvoram arautos da legalidade lamberam os coturnos, muitos deles  espontaneamente. . .
Só aqueles cidadãos que não aceitaram se deixar pôr de joelhos, não se deixaram vergar e intimidar, ofereceram resistência pelo único meio possível, terçando armas com os homicidas que ocuparam o poder e seus pistoleiros das polícias e aparato clandestino de repressão. 

A foto perpetua um instante na história e também a coragem e honradez de quem não correu para debaixo da cama, não se deixou vergar e intimidar pelos criminosos que por mais de 20 anos mandaram nesta República. 


[1] O livro "HÉRCULES 56" e o documentário com o mesmo nome, os dois de Silvio da Da-Rin, contêm o depoimento de alguns ex-guerrilheiros que participaram da ação e dos presos políticos libertados. http://www.youtube.com/watch?v=xxPNQfNpkOo    
[2] Documentário disponível no Youtube: "Vera Sílvia Magalhães - A história de uma guerrilheira" - http://www.youtube.com/watch?v=8OLiyKj08eU
[3] Alfredo Sirkis em seu livro "OS CARBONÁRIOS" narra com riqueza de pormenores a captura e troca do embaixador alemão. 

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