quinta-feira, 26 de abril de 2012


O STF, o “aborto” de anencéfalos e a arte de difamar      
        
                          
                                                                                                                 Difamadores amadores



Os Direitos Fundamentais do Cidadão

 As campanhas de ódio valem-se sempre do preconceito, apostam na ignorância e na capacidade de confundir a opinião pública. O alvo principal são aqueles cidadãos que se empenham em assegurar e ampliar os Direitos Fundamentais do Cidadão, os chamados DIREITOS HUMANOS, que por sua natureza existem para preservar a liberdade e a dignidade em face de outros cidadãos e do Estado.

Alguns destes direitos fundamentais tais como a livre manifestação do pensamento, a liberdade consciência e de crença, inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas inscritos no art. 5º, IV, VI, X, da Constituição Federal são os mais violados pelos agentes das campanhas de ódio.

O direito do cidadão defender livremente seu pensamento a respeito de quaisquer tema, seja religioso, político, filosófico ou científico é o primeiro a ser desrespeitado pelos propulsores das campanhas de ódio. Em um livro de Gore Vidal, "De fato e de ficção," ele aborda esta maneira de a direita infundir ruídos na comunicação e arrasar com seus adversários: o ardil consiste em vincular os inimigos a serem detratados a uma polêmica.

Instigar uma controvérsia, conduzir os inimigos a confessarem a falta de fé, a posicionar-se pela descriminalização das drogas ilícitas ou do aborto, reconhecer como legítimo civilmente o casamento de pessoas do mesmo sexo, ou veicular na mídia que o sujeito é gay ou lésbica, se mulher, em verdadeira incitação ao ódio e irracionalismo para intoxicar a opinião pública e manipulá-la é formula infalível para destruir a imagem pública e a reputação de adversários perante uma opinião pública de sociedades com laivos de medievalismo, dominada por religiões, preconceitos e outras manifestações de autoritarismo. Até difamadores amadores conhecem este mecanismo e conseguem tumultuar a comunicação e envolver adversários com razoável facilidade.

O cavalo de batalha preferido destas campanhas de ódio já foi o comunismo. Mas com a restauração do regime democrático em 1988 e o fim da Guerra Fria com o colapso do Capitalismo de Estado na Rússia e a dissolução da URSS este meio astucioso para provocar a histeria da opinião pública está bastante desmoralizado. Parte considerável da população faz questão de esquecer que um dia já foi embromada pelos grandes jornais que exigiam deposição de Jango acusando-o de ser um agente de Moscou conduzindo a opinião pública à histeria coletiva.

 Obviamente que os instigadores do ódio e da galvanização da opinião pública não  especificaram os muitos significados da palavra comunismo nem reconheceram que é um direito fundamental do cidadão defender a filosofia política que quiser, inclusive tem o direito de ser comunista. Assim, as campanhas de ódio anticomunistas já provocaram histeria na opinião pública até mesmo nos EUA.

De igual maneira omitem que dá palpites na vida sexual alheia sem ser convidado é no mínimo falta de educação pois é certa a violação ao direito que cada cidadão tem de ver sua vida privada e sua intimidade fora do alcance da curiosidade alheia. Além do mais o Código Penal assegura a liberdade sexual excluídas as condutas tipificadas como crime no Título VI, que trata dos crimes perpetrados contra a dignidade sexual.  

O “aborto” de anencéfalos

No momento o tema “quente”, aquele cuja agitação e discussão permite incitar a opinião pública contra adversários políticos é o aborto. Diga-se a propósito que este assunto tem sido utilizado para demonizar adversários desde a campanha para presidente da república em 2010. É de longe o mais utilizado para destruir a reputação dos adversários e manipular a opinião pública, constatado que a abordagem do tema é complexa, envolve direito, medicina, ética e até religião pois existem religiosos tentando contrabandear ou impor suas crenças sobre o tema.

Em face desta possibilidade de possíveis abordagens a predileção é inerente, pois permite confundir, provocar paixões, obnubilar as mentes e demonizar adversários mais facilmente.

Compreendendo por partes este tema, fazendo o oposto dos que querem confundir, se vê que a primeira coisa que tentam esconder é que o Estado brasileiro é laico e não pode ser instrumentalizado por nenhuma religião para impor suas crenças a ateus, agnósticos ou crentes de outras religiões.

Depois tentam esconder que do ponto de vista jurídico mesmo tendo o Pacto de São José da Costa Rica conceituado que a vida começa com a concepção o STF interpretou que a vida tem início catorze dias depois da fecundação do óvulo quando julgou a constitucionalidade da lei que regula a pesquisa com células tronco. Agora com o julgamento da ADPF que tratou do aborto de anencéfalos a divergência aflorou entre os ministros pois a posição majoritária fixou que sem a existência de cérebro não existe vida em potencial, daí não existir aborto em sentido jurídico, sé em sentido coloquial, em caso da interrupção da gestação de anencéfalos.

Para confundir e ilaquear a opinião pública vale tudo para os manipuladores profissionais, principalmente mentir. Mas gostam mesmo é do linchamento moral pelo incitamento da opinião pública ou simples ameaça de fazê-lo contra quem se opõe à manipulação.

Esquecem por conveniência que o Código Penal no art. 128 despenaliza o aborto se a concepção for resultado de estupro ou se o fruto da concepção for anencéfalo, o que se cometia anteriormente a esta decisão do STF sob a justa causa que é salvar a vida da gestante. Anote-se que entendeu o STF pelo voto da maioria de seus ministros que a interrupção de anencéfalo não é aborto, pois não há neste caso vida em potencial, não existe cérebro.

Então quando começa a vida humana? É do ponto de vista biológico, científico ou da medicina que a complexidade aumenta e não existe posição majoritária; isto é o mais ocultado pelos que desejam impor suas crenças como verdade absoluta. Como logo se vê, a resposta tem implicações sobre o tema aborto, entre outros mais como pesquisa com células tronco, pílula do dia seguinte e métodos contraceptivos.

Há quem defenda que a vida começa com a fecundação do óvulo pelo espermatozóide; quem defende esta posição é contra pílula do dia seguinte por considerá-la abortiva bem como é contra a pesquisa com células tronco e a fecundação in vitro, fora do útero.  Outros defendem que para existir vida humana é preciso existir coração e cérebro formados, o que implica aceitar que a vida começa a existir por volta da oitava semana depois da fecundação. Divergem destas posições os que defendem que a vida humana começa com a existência de pulmões e outros órgãos que permitam ao feto viver fora do útero, o que ocorre depois da vigésima quinta semana depois da concepção.

Com quando nada três respostas dada pela medicina para a questão que conceitua o marco temporal inicial da vida humana intra-uterina constata-se que não existe consenso nem no próprio STF. Assim, aquele que vier a escolher sua posição na discussão que a faça sabendo que não vai impô-la com base na ciência.

Pela complexidade do tema aborto, que envolve a resposta à pergunta quando começa a vida intra-uterina, ele é o preferido pelos detratores dos defensores dos Direitos Fundamentais, pois estes defendem a vida, a dignidade e a liberdade com ênfase e são muito facilmente envolvidos em uma polêmica infindável pelos manipuladores da opinião pública quando este é o assunto.

Agitar a defesa da vida sem dizer com base em que conceito; invocar princípios éticos sem dizer quais - possivelmente os princípios religiosos ou éticos retirados de sua própria religião para impor aos outros -, é apenas o meio com que os detratores dos Direitos Fundamentais se valem para alcançar um fim escuso que é a mistificação da opinião pública, demonizar adversários e manter o poder, que tem raízes psicosociais.

Contudo, com esta decisão sobre a interrupção da gestação de anencéfalos e outras decisões do STF alguma coisa se pode comemorar: o casamento civil de pessoas do mesmo sexo está difícil de ser manipulado pelos manipuladores de sempre, a liberdade de discutir a legalização das drogas proibidas está assegurada, demonizar os adversários como ateus ou comunistas está cada vez mais difícil, impedir pela intimidação que se discuta o aborto - quando nada nas hipóteses já asseguradas em lei -, ameaçando com o linchamento moral pelo incitamento da opinião pública perdeu força. 

Estas conquistas não são bagatela em uma sociedade que há pouco mais de 100 anos aboliu a escravidão, tem vivido sob sucessivas ditaduras supressoras dos Direitos Fundamentais - como todas as ditaduras -, tem uma quantidade absurda de analfabetos e é dominada pela OPUS DEI.

Não obstante, não se pode comemorar sem preocupações pois em uma sociedade em que o projeto fascista iniciado nas primeiras décadas do século passado ainda está longe de ser esgotado, sem poder aplicar a morte civil pela destruição da reputação a seus adversários a direita só terá como recurso para reconquistar o poder e manter um contingente de mão-de-obra de alguns milhões de pessoas em regime de semi-escravidão  a violência desnuda da ditadura.




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