MANTER A CABEÇA FORA D’AGUA
Fundado em fevereiro de 1980, o PT
completou 35 anos com desafios diferentes da época da fundação. Naquela época nos
faltava tudo, inclusive políticos.
Um partido
não existe sem políticos. Daí formar e renovar quadros para a
consecução de seus objetivos é um desafio contínuo na vida dos partidos e das
instituições que pretendem ser perenes e naquela época só tínhamos em potencial
este importante recurso humano.
Enfim, não tínhamos uma cultura
de como disputar eleições e como administrar Municípios à vista de que o partido
ainda não tinha formado quadros
políticos.
Nesta trajetória em que o partido
formou seus políticos, aprendeu a disputar eleições, a administrar e chegou ao
governo federal ocorrerá em Salvador,
BA, nos dias 11 a 13 de junho seu 5º Congresso em um momento crucial visto
que outros desafios surgiram e muita coisa importante será discutida e decidida
que impactará no futuro da legenda.
O
PT é um achado em termos de formulação política, é o
melhor partido do Brasil desde muito tempo porquanto não foi fundado para ser mais um velho Partido Comunista
e na situação do Brasil tem sido o partido possível, o melhor possível dentro
das circunstâncias sociais, políticas, culturais e éticas em que vivemos.
Mas tem seguido o caminho de todas as coisas com o envelhecimento de seus militantes e quadros, se modificou para
pior sob alguns aspectos para melhor em outros, penso eu. Contudo, as críticas
que sempre sofreu da esquerda de fora e de dentro do partido foi muitas
vezes por pura incompreensão do fato de que o PT não é mais um partido
leninista dos tantos que já foram criados.
Por não ser mais um Partido
Comunista livrou-se em parte da subcultura autoritária típica dos
PC's tais como a defesa do partido único, o monolitismo interno e
a pesada hierarquização. O PT nasceu defendendo a democracia e
praticando-a internamente pois inserida em seu estatuto[1] ao contrário dos
partidos leninistas que defendem a ditadura do proletariado e praticam o
centralismo democrático.
Não devemos olvidar que foi
Vladimir Lênin, um dos mais influentes estrategistas e táticos da esquerda - o
outro é Antonio Gramsci - que teorizou e construiu o partido que veio a ser o modelo
dos partidos filiados à III Terceira Internacional fundada sob sua
liderança em março de 1919.
Lênin impôs 21 condições[3]
para que um partido se filiasse à III Internacional. A condição 12 trata
de como estes partidos devem ser organizados, isto é, tendo como princípio o centralismo
democrático com poderes plenos do Comitê Central e disciplina
militar para seus filiados.
O partido leninista foi fundado
em 1903 e tinha o nome original de Partido
Operário Social-Democrata da Rússia – POSDR
- e somente em março de 1918 no seu VII Congresso mudou de nome para Partido Comunista Russo.
Como instrumento tático e
estratégico o partido leninista se caracteriza pela centralização
e hierarquização, prática conspiratória, a defesa da via
revolucionária como princípio e não como tática e a ditadura como
forma de governo.
O desdobramento destas ideias se
deu na Rússia depois da Revolução de Outubro de 1917 sob a forma de estatização
total dos meios de produção, planejamento centralizado, partido
único, ideologia oficial e os fatos históricos conhecidos.
Enquanto vigeram inquestionáveis
os dogmas do leninismo, o que ocorreu mesmo com o fim da III Internacional em
1943, grassou a mais absoluta falta de criatividade política na esquerda pois
encontrava-se engessada toda a capacidade tática e estratégica tanto no que diz
respeito a alianças políticas como no que diz respeito à criação de partidos, organizações e movimentos sociais.
A doutrina política socialista e
a teoria de partido desenvolvida pelo PT ao longo de sua existência têm sido
caracterizadas pela radicalização da democracia como único caminho para
o socialismo.
Ninguém duvida que democracia
é governo
do povo, pelo povo e para o povo e o desdobramento desta
premissa pelo PT tem se dado através do ORÇAMENTO
PARTICIPATIVO, planejamento
participativo e de Conselhos
Permanentes para que a sociedade controle as autoridades e a coisa
pública através da democracia
participativa.
O PT tomou o lugar dos PC’s (no
Brasil desde 1962 quando foi fundado o PC do B existiam dois Partidos
Comunistas, situação única no mundo) tendo desde sua fundação adesões no
movimento sindical, entre intelectuais, artistas e nas universidades.
Ocupar o lugar dos dois Partidos Comunistas foi relativamente
fácil para o PT pois o que inviabilizou o Partido Comunista no Brasil foi o
grave erro em que se constituiu a tentativa de levantar os quartéis
em 1935 com suas conseqüências infaustas.
Neste sentido vejo o PT como um
achado de lucidez, realismo e capacidade de formulação. Desenvolvemos uma
cultura política democrática e de participação, sobrevivemos a diversos ataques
mas o maior desafio está sendo sobreviver ao poder, o desafio maior do PT no
momento é governar e sobreviver como organização política.
Sobreviver ao poder também será sobreviver
ao ataque externo mais duro com o intuito destruir o partido na opinião
pública. Os meios de comunicação propriedades de seis famílias ilegalmente
se propuseram a destruir um partido proscrevendo-o pela veiculação de notícias
manipuladas quando não totalmente inventadas.
Este ataque tem também como
objetivo a tentativa de dividir o partido pois existem companheiros que só têm
treinamento para ser de oposição, só têm programação mental para criticar, e para
nunca governar.
Quem
ganha a eleição governa, quem perde fica na oposição. Governar
tem um custo político, é preciso entender isto; ser oposição também tem
seu preço. E não é possível ser oposição e governo ao mesmo tempo.
Do meu ponto de vista o partido
tem ido bem, nunca a esquerda teve gente tão preparada como a que resultou da
esquerda dissidente dos PC’s que fez a luta armada, fundou e dirigiu o partido
na conquista do governo federal.
Contudo, surgiu daí o grande
desafio: governar sem ser destruído, sem desintegrar, sobreviver como partido
pois é preciso fazer o governo possível - com alianças, sem elas
o PT não se elegeria nem governaria - e sobreviver como organização política.
Para mim este desafio será
respondido por duas vertentes: existem pessoas do povo que acreditam no
partido e está com ele para o que vier, conheço gente assim, e que mesmo sem entender
em pormenores as tramas da classe dominante não lhes dão crédito, ad exemplum, a farsa jurídica e
midiática chamada de "mensalão" influenciou minimamente as eleições.
A outra vertente será de militantes
que têm um discernimento maior da luta política, tem uma cultura geral e política para entender
a necessidade de manter a organização política partidária,
principalmente quando esta está sob ataque como é o caso desde a chegada do PT
ao governo federal.
Esta vertente militante será a
que defenderá também o partido do ataque por dentro dos que querem se
apropriar da sigla para fins escusos ou dela se aproximar para retirar algum
proveito, por menor que seja.
Em torno de lideranças e partidos
políticos existe um baixo clero da classe política[2] que deles se aproxima como moscas
no intuito somente de retirar algum proveito material. Buscam servir-se do que puder, algum dinheiro, cargos no
último escalão, um almoço, e estão
disponíveis para que o líder e os partidos deles se sirvam. Se não
forem controlados podem emporcalhar qualquer causa, partido ou político.
Diante das circunstâncias duras e
dos ataques diuturnos que estão ocorrendo alguns petistas vão espirrar ou por
não compreenderem o que está acontecendo, o desafio que temos, ou por fraqueza
ou por esperteza alguns irão abandonar o navio; Marta Suplicy já espirrou.
É por isto que é um desafio governar e o outro é não ser destruído pelas coisas do poder; por exemplo, o poder
divide militantes e políticos pois ou se é contra ou a favor das medidas do governo, qualquer governo,
raramente se é indiferente.
A esquerda nunca foi um prodígio
em finanças públicas. Esta constatação me fazia temer a chegada do PT
ao poder. Existe receita ou despesa de esquerda e de direita? É possível inventar dinheiro sem fazer
concorrência à Casa da Moeda?
Como empurrar a conta do ajuste
fiscal no bolso dos mais ricos, como deveria ser, se nem votar a lei
orçamentária de 2015 conseguimos sem o consentimento dos caras comandados por
Eduardo Cunha?
Para que os mais ricos do país
pagassem de maneira justa a parte que lhes cabe pagar no ajuste fiscal seria
preciso tributá-los. E tributar ricos é difícil, é preciso ter poder para tal,
e tem o poder no atual sistema de financiamento privado de campanha quem tem a
grana para ganhar as eleições ou alugar mandatos.
Nas circunstâncias institucionais
que temos o poder é dividido, sem maioria no Congresso o Executivo Federal tem
meio poder, se tanto. Isto sem levar em consideração o Ministério Público e o
Judiciário, que não são objeto de disputa política democrática, são reservas
intocáveis da classe dominante.
Para o Governo Federal direcionar
os gastos do ORÇAMENTO PÚBLICO DA UNIÃO
para atender as finalidades estabelecidas pelo governo é preciso leis votadas no Congresso e sem
ter o voto da maioria dos Deputados isto não é possível.
O governo federal está
extremamente fragilizado, fato decorrente de um Congresso hostil ao Executivo;
um Executivo de esquerda e um Congresso de direita é um nó político difícil de
desatar. O partido vai ter que negociar votação por votação para poder fazer a
maioria e votar os projetos de leis que estejam de acordo com as finalidades
programáticas da aliança que reelegeu a Presidenta Dilma.
Mesmo com todas as dificuldades
considero que o PT no governo federal tem se saído bem, sem trair eleitores nem
a seus objetivos programáticos advindo da aliança. Nos governos estaduais e
municipais cada caso é um caso e tem deixado a desejar.
Daí, mantermos o partido com a
cabeça fora d’água, melhorá-lo livrando-o dos invasores oportunistas e
aproveitadores é o desafio, enfim, defender o partido dos ataques envidados por
fora e por dentro é o que melhor poderemos fazer.
Devemos
aprender com os fatos. Qualquer partido de esquerda que chegar ao poder
vai sofrer os mesmos ataques que o PT tem sofrido e dos mesmos inimigos.
Este
é um fato da vida. Quando uma coisa é muito boa é natural que seja disputada,
copiada ou combatida pela concorrência. Defender o partido como
organização política é indispensável mas será para poucos; e é neste ponto que
reside o perigo pois se não for defendida com competência os aproveitadores do
baixo clero da classe política vão tomar conta da sigla bem como o partido
submergirá aos ataques dos inimigos conhecidos.
Para mim não adianta fugir
desta luta, outra sigla que percorra o caminho do PT passará pelos
mesmos problemas, sofrerá os mesmos ataques dos mesmos inimigos,
não adianta inventar nova sigla.
Notas
[1] Estatuto do PT
[2] Uso aqui o
conceito classe política para designar aqueles que Max Weber em seu
livro A Política como Vocação
descreve como vivendo da política e para a política, enfim, que exercem a
politica como profissão.
https://www.academia.edu/9868851/As_21_condi%C3%A7%C3%B5es_de_admiss%C3%A3o_dos_Partidos_na_Internacional_Comunista